quinta-feira, 12 de abril de 2012

Biografia de M

Martinho Lute

Martinho Lutero

Lutero em 1529 por Lucas Cranach
Nome completoMartinus Luter (Martin Luther)
Nascimento10 de Novembro de 1483
Eisleben, Saxônia-Anhalt, (Sacro Império Romano-Germânico)
Morte18 de fevereiro de 1546 (62 anos)
Eisleben, Alemanha
CônjugeCatarina von Bora (1499-1546)
Ocupaçãoteólogo
AssinaturaAutograf, Martin Luther, Nordisk familjebok.png
Martinho Lutero (Eisleben, 10 de novembro de 1483 - 18 de fevereiro de 1546) foi um sacerdote agostiniano e professor de teologia alemão figura central da Reforma Protestante. Veementemente contestando a alegação de que a liberdade da punição de Deus sobre o pecado poderia ser comprada, confrontou o vendedor de indulgências Johann Tetzel com suas 95 Teses em 1517. Sua recusa em retirar seus escritos a pedido do Papa Leão X em 1520 e do Imperador Carlos V na Dieta de Worms em 1521 resultou em sua excomunhão pelo papa e a condenação como um fora-da-lei pelo imperador.
Lutero ensinava que a salvação não se consegue apenas com boas ações, mas de um livre presente de Deus, recebida apenas pela graça através da fé em Jesus como um redentor do pecado. Sua teologia desafiou a autoridade papal na Igreja Católica Romana, pois ele ensinava que a Bíblia é a única fonte de conhecimento divinamente revelada[1] e opôs-se ao sacerdotalismo, por considerar todos os cristãos batizados como um sacerdócio santo.[2] Aqueles que se identificavam com os ensinamentos de Lutero eram chamados luteranos.
Sua tradução da Bíblia em outros idiomas que não o latim) fez o livro mais acessível, causando um impacto gigantesco na Igreja e na cultura alemã. Promoveu um desenvolvimento de uma versão padrão da língua alemã, adicionando vários princípios à arte de traduzir[3], e influenciou a tradução para o inglês da Bíblia do Rei James.[4] Seus hinos influenciaram o desenvolvimento do ato de cantar em igrejas.[5] Seu casamento com Catarina von Bora estabeleceu um modelo para a prática do casamento clerical, permitindo o matrimônio de padres protestantes.[6]
Em seus últimos anos, Lutero tornou-se algo antissemita, chegando a escrever que as casas judaicas deveriam ser destruídas, e suas sinagogas queimadas, dinheiro confiscado e liberdade cerceada. Essas afirmações fizeram de Lutero uma figura controversa entre muitos historiadores e estudiosos.[7]

Primeiros anos de vida

Martinho Lutero, cujo nome em alemão era Martin Luther ou Luder, era filho de Hans Luther e Margarethe Lindemann. Mudou-se para Mansfeld, onde seu pai dirigia várias minas de cobre. Tendo sido criado no campo, Hans Luther desejava que seu filho viesse a se tornar um funcionário público, melhorando, assim, as condições da família. Com esse objetivo, enviou o já velho Martinho para escolas em Mansfeld, Magdeburgo e Eisenach.
Aos dezessete anos, em 1501, Lutero ingressou na Universidade de Erfurt, onde tocava alaúde e onde recebeu o apelido de O Filósofo. Ainda na Universidade de Erfurt, estudou a filosofia nominalista de Ockham (as palavras designam apenas coisas individuais; não atingem os “universais”, as realidades presentes em todos os indivíduos, como por exemplo a natureza humana; em consequência, nada pode ser conhecido com certeza pela razão natural, exceto as realidades concretas: esta pessoa, aquela coisa). Esse sistema dissolvia a harmonia multissecular entre a ciência e a fé que tanto havia sido defendida pela escolástica de "São Jesus Cristo", pois essa filosofia baseava-se unicamente na vontade de Deus. O jovem estudante graduou-se bacharel em 1502 e concluiu o mestrado em 1505, sendo o segundo entre dezessete candidatos[8]. Seguindo os desejos maternos, inscreveu-se na escola de Direito da mesma Universidade. Mas tudo mudou após uma grande tempestade com descargas elétricas, ocorrida naquele mesmo ano (1505): um raio caiu próximo de onde ele estava passando, ao voltar de uma visita à casa dos pais. Aterrorizado, teria, então, gritado: "Ajuda-me, Sant'Ana! Eu me tornarei um monge!"
Tendo sobrevivido aos raios, deixou a faculdade, vendeu todos os seus livros, com exceção dos de Virgílio, e entrou para a ordem dos Agostinianos, de Frankfurt, a 17 de julho de 1505.[9].

Vida monástica e acadêmica


Lutero com a tonsura monástica.
O jovem Martinho Lutero dedicou-se por completo à vida no mosteiro, empenhando-se em realizar boas obras a fim de agradar a Deus e servir ao próximo através de orações por suas almas. Dedicou-se intensamente à meditação, às autoflagelações, às muitas horas de oração diárias, às peregrinações e à confissão. Quanto mais tentava ser agradável ao Senhor, mais se dava conta de seus pecados[10]
Johann von Staupitz, o superior de Lutero, concluiu que o jovem necessitava de mais trabalhos, para afastar-se de sua excessiva reflexão. Ordenou, portanto, ao monge que iniciasse uma carreira acadêmica. Em 1507, Lutero foi ordenado sacerdote. Em 1508, começou a lecionar Teologia na Universidade de Wittenberg. Lutero recebeu seu bacharelado em Estudos bíblicos a 19 de março de 1508. Dois anos depois, visitou Roma, de onde regressou bastante decepcionado.[11]
Em 19 de outubro de 1512, Martinho Lutero graduou-se Doutor em Teologia e, em 21 de outubro do mesmo ano, foi "recebido no Senado da Faculdade Teológica" com o título de "Doutor em Bíblia". Em 1515, foi nomeado vigário de sua ordem tendo sob sua autoridade onze monastérios.
Durante esse período, estudou grego e hebraico, para aprofundar-se no significado e origem das palavras utilizadas nas Escrituras - conhecimentos que logo utilizaria para a sua própria tradução da Bíblia.

A controvérsia acerca das indulgências

Além de suas atividades como professor, Martinho Lutero ainda colaborava como pregador e confessor na igreja de Santa Maria, na cidade. Também pregava habitualmente na igreja do Castelo (chamada de "Todos os Santos" - porque ali havia uma coleção de relíquias, estabelecidas por Frederico III da Saxônia). Foi durante esse período que o jovem sacerdote se deu conta dos problemas que o oferecimento de indulgências aos fiéis, como se esses fossem fregueses, poderia acarretar.
A indulgência é a remissão (parcial ou total) do castigo temporal imputado a alguém por conta dos seus pecados. Naquele tempo qualquer pessoa poderia comprar uma indulgência, quer para si mesmo, quer para um parente já morto que estivesse no Purgatório. O frade Johann Tetzel fora recrutado para viajar através dos territórios episcopais do arcebispo Alberto de Mogúncia, promovendo e vendendo indulgências com o objetivo de financiar as reformas da Basílica de São Pedro, em Roma.
Lutero viu este tráfico de indulgências como um abuso que poderia confundir as pessoas e levá-las a confiar apenas nas indulgências, deixando de lado a confissão e o arrependimento verdadeiros. Proferiu, então, três sermões contra as indulgências em 1516 e 1517. Segundo a tradição, a 31 de outubro de 1517 foram afixadas as 95 Teses na porta da Igreja do Castelo de Wittenberg, com um convite aberto ao debate sobre elas. Essas teses condenavam o que Lutero acreditava ser a avareza e o paganismo na Igreja como um abuso e pediam um debate teológico sobre o que as Indulgências significavam. Para todos os efeitos, contudo, nelas Lutero não questionava diretamente a autoridade do Papa para conceder as tais indulgências.
As 95 Teses foram logo traduzidas para o alemão e amplamente copiadas e impressas. Ao cabo de duas semanas se haviam espalhado por toda a Alemanha e, em dois meses, por toda a Europa. Este foi o primeiro episódio da História em que a imprensa teve papel fundamental, pois facilitou a distribuição simples e ampla do documento.


A resposta do Papado

Depois de fazer pouco caso de Lutero, dizendo que ele seria um "alemão bêbado que escrevera as teses", e afirmando que "quando estiver sóbrio mudará de opinião"[12] o Papa Leão X ordenou, em 1518, ao professor de teologia dominicano Silvestro Mazzolini que investigasse o assunto. Este denunciou que Lutero se opunha de maneira implícita à autoridade do Sumo Pontífice, quando discordava de uma de suas bulas. Declarou ser Lutero um herege e escreveu uma refutação acadêmica às suas teses. Nela, mantinha a autoridade papal sobre a Igreja e condenava as teorias de Lutero como um desvio e uma apostasia.
Lutero replicou de igual forma (academicamente), dando assim início à controvérsia.
Enquanto isso, Lutero tomava parte da convenção dos agostinianos em Heidelberg, onde apresentou uma tese sobre a escravidão do homem ao pecado e a graça divina. No decorrer da controvérsia sobre as indulgências, o debate se elevou até o ponto de duvidar do poder absoluto e autoridade do Papa, pois as doutrinas de "Tesouraria da Igreja" e "Tesouraria dos Merecimentos", que serviam para reforçar a doutrina e venda e das indulgências, haviam se baseado na bula papal "Unigenitus", de 1343, do Papa Clemente VI. Por causa de sua oposição a esta doutrina, Lutero foi qualificado como heresiarca e o Papa, decidido a suprimir por completo os seus pontos de vista, ordenou que ele fosse chamado a Roma, viagem que deixou de ser realizada por motivos políticos.
Lutero, que anteriormente professava a obediência implícita à Igreja, negava agora abertamente a autoridade papal e apelava para que fosse realizado um Concílio. Também declarava que o papado não formava parte da essência imutável da Igreja original.
Desejando manter relações amistosas com o protetor de Lutero, Frederico, o Sábio, o Papa engendrou uma tentativa final de alcançar uma solução pacífica para o conflito. Uma conferência com o representante papal Karl von Miltitz em Altenburg, em janeiro de 1519, levou Lutero a decidir guardar silêncio, tal qual seus opositores. Também escreveu uma humilde carta ao Papa e compôs um tratado demonstrando suas opiniões sobre a Igreja Católica. A carta nunca chegou a ser enviada, pois não continha nenhuma retratação; e no tratado que compôs mais tarde, negou qualquer efeito das indulgências no Purgatório.
Quando Johann Ecko desafiou um colega de Lutero, Andreas Carlstadt, para um debate em Leipzig, Lutero juntou-se à discussão (27 de junho-18 de julho de 1519), no curso do qual negou o direito divino do solidéu papal e da autoridade de possuir o as chaves do Céu que, segundo ele, haviam sido outorgadas apenas ao próprio Apóstolo Pedro, não passando para seus sucessores.[13][14] Negou que a salvação pertencesse à Igreja Católica ocidental sob a autoridade do Papa, mas que esta se mantinha na Igreja Ortodoxa, do Oriente. Depois do debate, Eck afirmou que forçara Lutero a admitir a semelhança de sua própria doutrina com a de João Huss, que havia sido queimado na fogueira da Inquisição. Alguns meses após a chegada dos cardeais vindos de Roma, Martinho Lutero, monge da Igreja Católica, doutor em Humanidades pela Universidade de Erfurt e professor da Universidade de Wittenberg.

Aumenta a cisão

Lutero durante os acontecimentos


Martinho Lutero.
Não parecia haver esperanças de entendimento. Os escritos de Lutero circulavam amplamente, alcançando França, Inglaterra e Itália, em 1519, e os estudantes dirigiam-se a Wittenberg para escutar Lutero que, naquele momento, publicava seus comentários sobre a Epístola aos Gálatas e suas "Operationes in Psalmos" (Trabalho nos Salmos).
As controvérsias geradas por seus escritos levaram Lutero a desenvolver suas doutrinas mais a fundo, e o seu "Sermão sobre o Sacramento Abençoado do Verdadeiro e Santo Corpo de Cristo, e suas Irmandades", ampliou o significado da Eucaristia para incluir também o perdão dos pecados e ao fortalecimento da fé naqueles que a recebem. Além disso, ele ainda apoiava a realização de um concílio a fim de restituir a comunhão.
O conceito luterano de "igreja" foi desenvolvido em seu "Von dem Papsttum zu Rom" (Sobre o Papado de Roma), uma resposta ao ataque do franciscano Augustin von Alveld, em Leipzig (junho de 1520). Enquanto o seu "Sermon von guten Werken" (Sermão das Boas Obras), publicado na primavera de 1520, era contrário à doutrina católica das boas obras e dos atos como meio de perdão, mantendo que as obras do crente são verdadeiramente boas, quer para o secular como para o clérigo, se ordenadas por Deus.

Os tratados de 1520

A Nobreza alemã

A disputa havida em Leipzig, em 1519, fez com que Lutero travasse contato com os humanistas, especialmente Melanchthon, Reuchlin e Erasmo de Roterdã, que por sua vez também influenciara ao nobre Franz von Sickingen. Von Sickingen e Silvestre de Schauenbur queriam manter Lutero sob sua proteção, convidando-o para seus castelos na eventualidade de não ser-lhe seguro permanecer na Saxônia, em virtude da proscrição papal.
Sob essas circunstâncias de crise, e confrontando aos nobres alemães, Lutero escreveu "À Nobreza Cristã da Nação Alemã" (agosto de 1520), onde recomendava ao laicado, como um sacerdote espiritual, que fizesse a reforma requerida por Deus, mas abandonada pelo Papa e pelo clero. Pela primeira vez Lutero referiu-se ao Papa como o Anticristo[15].
As reformas que Lutero propunha não se referiam apenas a questões doutrinárias, mas também aos abusos eclesiásticos:
  • a diminuição do número de cardeais e outras exigências da corte papal;
  • a abolição das rendas do Papa;
  • o reconhecimento do governo secular;
  • a renúncia da exigência papal pelo poder temporal;
  • a abolição dos Interditos e abusos relacionados com a excomunhão;
  • a abolição das peregrinações nocivas;
  • a eliminação dos excessivos dias santos;
  • a supressão dos conventos para monjas, da mendicidade e da suntuosidade; a reforma das universidades;
  • a ab-rogação do celibato do clero;
  • e, finalmente, uma reforma geral na moralidade pública.
Muitas destas propostas refletiam os interesses da nobreza alemã, revoltada com sua submissão ao Papa e, principalmente, com o fato de terem que enviar riquezas a Roma.

O cativeiro babilônico

Lutero gerou muitas polêmicas doutrinárias com seu "Prelúdio no Cativeiro Babilônico da Igreja", em especial no que diz respeito aos sacramentos.
  • Eucaristia - apoiava que fosse devolvido o "cálice" ao laicado; na chamada questão do dogma da transubstanciação, afirmava que era real a presença do corpo e do sangue do Cristo na eucaristia, mas refutava o ensinamento de que a eucaristia era o sacrifício oferecido por Deus.
  • Batismo - ensinava que trazia a justificação apenas se combinado com a fé salvadora em o receber; de fato, mantinha o princípio da salvação inclusive para aqueles que mais tarde se convertessem.
  • Penitência - afirmou que sua essência consiste na palavra de promessa de desculpas recebidas com fé.
Para ele, apenas estes três sacramentos podiam assim ser considerados, pois sua instituição era divina e a promessa da salvação de Deus estava conexa a eles. Contudo, em sentido estrito, apenas o batismo e a eucaristia seriam verdadeiros sacramentos, pois apenas eles tinham o "sinal visível da instituição divina": a água no batismo e o pão e vinho da eucaristia. Lutero negou, em seu documento, que a confirmação (Crisma), o matrimônio, a ordenação sacerdotal e a extrema-unção fossem sacramentos.

Liberdade de um Cristão

Da mesma forma, o completo desenvolvimento da doutrina de Lutero sobre a salvação e a vida cristã foi exposto em "A Liberdade de um Cristão" (publicado em 20 de novembro de 1520, onde exigia uma completa união com Cristo mediante a palavra através da fé, e a inteira liberdade do cristão como sacerdote e rei sobre todas as coisas exteriores, e um perfeito amor ao próximo).
As duas teses que Lutero desenvolve nesse tratado são aparentemente contraditórias, mas, em verdade, são complementares:
  • "O cristão é um senhor libérrimo sobre tudo, a ninguém sujeito";
  • "O cristão é um servo oficiosíssimo de tudo, a todos sujeito".
A primeira tese é válida "na fé"; a segunda, "no amor".

A excomunhão

A 15 de junho de 1520, o Papa advertiu Lutero, com a bula "Exsurge Domine", onde o ameaçava com a excomunhão, a menos que, num prazo de sessenta dias, repudiasse 41 pontos de sua doutrina, destacados pela Igreja..
Em outubro de 1520, Lutero enviou seu escrito "A Liberdade de um Cristão" ao Papa, acrescentando a frase significativa:
"Eu não me submeto a leis ao interpretar a palavra de Deus".
Enquanto isso, um rumor chegara de que Johan Ech saíra de Meissem com uma proibição papal, enquanto este se pronunciara realmente a 21 de setembro. O último esforço de paz de Lutero foi seguido, em 12 de dezembro, da queima da bula, que já tinha expirado há 120 dias, e o decreto papa de Wittenberg, defendendo-se com seus "Warum des Papstes und seiner Jünger Bücher verbrannt sind" e "Assertio omnium articulorum". O Papa Leão X excomungou Lutero a 3 de janeiro de 1521, na bula "Decet Romanum Pontificem".
A execução da proibição, com efeito, foi evitada pela relação do Papa com Frederico III da Saxônia, e pelo novo imperador, Carlos I de Espanha (Carlos V de Habsburgo), que julgou inoportuno apoiar as medidas contra Lutero, diante de sua posição face à Dieta.

Castelo Wartburg em Eisenach.

A Dieta de Worms

Ver artigo principal: Dieta de Worms
O Imperador Carlos V inaugurou a Dieta real a 22 de janeiro de 1521. Lutero foi chamado a renunciar ou confirmar seus ditos e foi-lhe outorgado um salvo-conduto para garantir-lhe o seguro deslocamento.
A 16 de abril, Lutero apresentou-se diante da Dieta. Johann Eck, assistente do Arcebispo de Trier, mostrou a Lutero uma mesa cheia de cópias de seus escritos. Perguntou-lhe, então, se os livros eram seus e se ele acreditava naquilo que as obras diziam. Lutero pediu um tempo para pensar em sua resposta, o que lhe foi concedido. Este, então, isolou-se em oração e depois consultou seus aliados e amigos, apresentando-se à Dieta no dia seguinte. Quando a Dieta veio a tratar do assunto, o conselheiro Eck pediu a Lutero que respondesse explicitamente à seguinte questão:
"Lutero, repeles seus livros e os erros que eles contêm?"
Lutero, então, respondeu:
"Que se me convençam mediante testemunho das Escrituras e claros argumentos da razão - porque não acredito nem no Papa nem nos concílios já que está provado amiúde que estão errados, contradizendo-se a si mesmos - pelos textos da Sagrada Escritura que citei, estou submetido a minha consciência e unido à palavra de Deus. Por isto, não posso nem quero retratar-me de nada, porque fazer algo contra a consciência não é seguro nem saudável."
De acordo com a tradição, Lutero, então, proferiu as seguintes palavras:
"Não posso fazer outra coisa, esta é a minha posição. Que Deus me ajude![16]
Nos dias seguintes, seguiram-se muitas conferências privadas para determinar qual o destino de Lutero. Antes que a decisão fosse tomada, Lutero abandonou Worms. Durante seu regresso a Wittenberg, desapareceu.
O Imperador redigiu o Édito de Worms a 25 de maio de 1521, declarando Martinho Lutero fugitivo e herege, e proscrevendo suas obras.

Processo Romano

Martinho Lutero e o Cardeal Caetano, em 1557
Em Junho de 1518, foi aberto o processo contra Lutero, com base na publicação das suas 95 Teses. Alegava-se, com o exame do processo, que ele incorria em heresia. Nas aulas que ministrava na Universidade de Wittenberg, espiões registravam seus comentários negativos sobre a excomunhão. Depois disso, em agosto de 1518, o processo foi alterado para heresia notória. Lutero foi convidado a ir a Roma, onde teria que desmentir sua doutrina.
Lutero recusou-se a fazê-lo, alegando razões de saúde; e pretendeu uma audiência em território alemão. O seu pedido baseava-se no argumento (Gravamina) da Nação Alemã. Seu pedido foi aceito, ele foi convidado para uma audiência com o cardeal Caetano de Vio (Tomás Caetano), durante a reunião das cortes (Reichstag) imperiais de Augsburg. Entre 12 e 14 de outubro de 1518, Lutero falou a Caetano. Este pediu-lhe que revogasse sua doutrina. Lutero recusou-se a fazê-lo.
Do lado romano, o caso pareceu terminado. Por causa da morte de Imperador Maximiliano I (Janeiro de 1519), houve uma pausa de dois anos no andamento do processo. O Imperador tinha decidido que o seu sucessor seria Carlos (futuro Carlos V). Por causa das pertenças de Carlos em Itália, o papa renascentista Leão X receava o cerco do Estado da Igreja e procurava evitar que os príncipes-eleitores alemães (Kurfürsten) renunciassem a Carlos.
O papel de protetor de Lutero assumido por Frederico, o sábio, levou a que Roma pedisse que Karl von Miltiz intercedesse junto ao príncipe por uma solução razoável. Após a escolha de Carlos V como imperador (26 de junho de 1519), o processo de Lutero voltaria a ser alvo de preocupações e trabalhos.
Em junho de 1520, reapareceu a ameaça no escrito "Exsurge Domini" e, em janeiro de 1521, a bula "Decet Romanum Pontificem" excomungou Lutero. Seguiu-se, então, a ameaça oficial do imperador (Reichsacht).
Notável é, no entanto, que Lutero foi, mais uma vez, recebido em audiência, o que também deixou claras as diferenças entre o papado e o império. Carlos foi o último rei (após uma reconciliação) a ser coroado imperador pelo papa. Nos dias 17 e 18 de Abril de 1521 Lutero foi ouvido na Dieta de Worms (conferência governativa) e, após ter negado a revogação da sua doutrina, foi publicado o Édito de Worms, banindo Lutero.

Exílio no Castelo de Wartburg

O seqüestro de Lutero durante a sua viagem de regresso da Dieta de Worms foi arranjado. Frederico, o sábio ordenou que Lutero fosse capturado por um grupo de homens mascarados a cavalo, que o levaram para o Castelo de Wartburg, em Eisenach, onde ele permaneceu por cerca de um ano. Deixou crescer a barba e tomou as vestes de um cavaleiro, assumindo o pseudônimo de Jörg. Durante esse período de retiro forçado, Lutero trabalhou na sua célebre tradução da Bíblia para o alemão.

Martinho Lutero pregando no Castelo Wartburg, quadro de Hugo Vogel.
Com o início da estadia de Lutero em Wartburg, começou um período muito construtivo de sua carreira como reformista. Em seu "Deserto" ou "Patmos" (como ele mesmo chamava, em suas cartas) de Wartburg, começou a tradução da Bíblia, da qual foi impresso o Novo Testamento, em setembro de 1522.
Em Wartburg, ele produziu outros escritos, preparou a primeira parte de seu Guia para Párocos e "Von der Beichte" (Sobre a Confissão), em que nega a obrigatoriedade da confissão, e admite como saudável a confissão privada voluntária. Também escreveu contra o Arcebispo Albrecht, a quem obrigou, com isso, a desistir de retomar a venda das indulgências. Em seus ataques a Jacobus Latomus, avançou em sua visão sobre a relação entre a graça e a lei, assim como sobre a natureza revelada pelo Cristo, distinguindo o objetivo da graça de Deus para o pecador que, por acreditar, é justificado por Deus devido à justiça de Cristo, pois a graça salvadora reside dentro do homem pecador. Ainda mostrou que o "princípio da justificação" é insuficiente, ante a persistência do pecado depois do batismo - pela inerência do pecado em cada boa obra.
Lutero, amiúde, escrevia cartas a seus amigos e aliados, respondendo-lhes ou perguntando-lhes por seus pontos de vista e respondendo-lhes aos pedidos de conselhos. Por exemplo, Felipe Melanchthon lhe escreveu perguntando como responder à acusação de que os reformistas renegavam a peregrinação e outras formas tradicionais de piedade. Lutero respondeu-lhe em 1 de agosto de 1521:
"Se és um pregador da misericórdia, não pregues uma misericórdia imaginária, mas sim uma verdadeira. Se a misericórdia é verdadeira, deve penitenciar ao pecado verdadeiro, não imaginário. Deus não salva apenas aqueles que são pecadores imaginários. Conheça o pecador, e veja se os seus pecados são fortes, mas deixai que tua confiança em Cristo seja ainda mais forte, e que se alegre em Cristo que é o vencedor sobre o pecado, a morte e o mundo. Cometeremos pecados enquanto estivermos aqui, porque nesta vida não há um só lugar onde resida a justiça. Nós todos, sem embargo, disse Pedro (2ª Pedro 3:13), estamos buscando mais além um novo céu e uma nova terra onde a justiça reinará".

Seu quarto no castelo de Wartburg, em Eisenach.
Enquanto isso, alguns sacerdotes saxônicos haviam renunciado ao voto de castidade, ao mesmo tempo em que outros tantos atacavam os votos monásticos. Lutero, em seu De votis monasticis (Sobre os votos monásticos), aconselhava-os a ter mais cautela, aceitando, no fundo, que os votos eram geralmente tomados "com a intenção da salvação ou à busca de justificação". Com a aprovação de Lutero em seu "De abroganda missa privata (Sobre a abrogação da missa privada), mas contra a firme oposição de seu prior, os agostinianos de Wittenberg realizaram a troca das formas de adoração e terminaram com as missas. Sua violência e intolerância certamente desagradaram Lutero que, em princípios de dezembro, passou alguns dias entre eles. Ao retornar para Wartburg, escreveu "Eine treue Vermahnung … vor Aufruhr und Empörung" (Uma sincera admoestação por Martinho Lutero a todos os cristãos para que se resguardem da insurreição e rebelião). Apesar disso, em Wittengerg, Carlstadt e o ex-agostiniano Gabriel Zwilling reclamavam a abolição da missa privada e da comunhão em duas espécies, assim como a eliminação das imagens nas igrejas e a ab-rogação do celibato.

Regresso a Wittenberg e os Sermões Invocavit

No final do ano de 1521, os anabatistas de Zwickau se entregam à anarquia. Contrário a tais concepções radicais e temendo seus resultados, Lutero regressou em segredo a Wittenberg, em 6 de março de 1522. Durante oito dias, a partir de 9 de março (domigo de Invocavit) e concluindo no domingo seguinte, Lutero pregou outros tantos sermões que tornaram-se conhecidos como os "Sermões de Invocavit".
Nessas pregações, Lutero aconselhou uma reforma cuidadosa, que leve em consideração a consciência daqueles que ainda não estivessem persuadidos a acolher a Reforma. A consagração do pão foi restaurada por um tempo e o cálice sagrado foi ministrado somente àqueles do laicado que o desejaram. O cânon das missas, devido ao seu caráter imolatório, foi suprimido. Devido ao sacramento da confissão ter sido abolido, verificou-se a necessidade que muitas pessoas ainda tinham de confessar-se em busca do perdão. Esta nova forma de serviço foi dada a Lutero em "Formula missæ et communionis" (Fórmula da missa e Comunhão), de 1523. Em 1524 surgiu o primeiro hinário de Wittenberg, com quatro hinos.
Como aquela parte da Saxônia era governada pelo Duque Jorge, que proibira seus escritos, Lutero declarou que a autoridade civil não podia promulgar leis para a alma. Fez isso em sua obra: "Über die weltliche Gewalt, wie weit man ihr Gehorsam schuldig sei" (Autoridade Temporal: em que medida deve ser obedecida).

Matrimônio e família

Em abril de 1523, Lutero ajudou 12 freiras a escaparem do cativeiro no Convento de Nimbschen. Entre essas freiras encontrava-se Catarina von Bora, filha de nobre família, com quem veio a se casar, em 13 de junho de 1525. Dessa união nasceram seis filhos: Johannes, Elisabeth, Magdalena, Martin, Paul e Margaretha. Dos seis filhos, Margaretha foi a única que manteve a linhagem até os dias de hoje. Um descendente ilustre da família Lutero é o ex-presidente alemão Paul von Hindenburg.
O casamento de Lutero com a ex-freira cisterciense incentivou o casamento de outros padres e freiras que haviam adotado a Reforma. Foi um rompimento definitivo com a Igreja Romana.

 artinho Lutero




Martinho Lutero era filho de Hans Luther e Margarethe Lindemann. Mudou-se para Mansfeld, onde seu pai dirigia várias minas de cobre. Tendo sido criado no campo, Hans Luther desejava que seu filho viesse a se tornar um funcionário público, melhorando assim as condições da família. Com este objetivo, enviou o jovem Martinho para escolas em Mansfeld, Magdeburgo e Eisenach.

Aos dezessete anos, em 1501, Lutero ingressou na Universidade de Erfurt, onde tocava alaúde e recebeu o apelido de O Filósofo. Seguindo os desejos paternos, inscreveu-se na escola de Direito dessa Universidade. Mas tudo mudou após uma grande tempestade, com descargas elétricas, ocorrida neste mesmo ano (1505): ao voltar de uma visita à casa dos pais, um raio caiu próximo de onde ele estava. Aterrorizado, gritara então: — Ajuda-me, Sant'Ana! Eu me tornarei um monge!

Tendo sobrevivido aos raios, deixou a faculdade, vendeu os seus livros com exceção dos de Virgílio, e entrou para a ordem dos Agostinianos, de Erfurt, a 17 de julho de 1505.

O jovem Martinho Lutero dedicou-se por completo à sua vida no mosteiro, empenhando-se em realizar boas obras a fim de agradar a Deus e servir ao próximo através de orações por suas almas. Dedicou-se intensamente à meditação entregando-se a muitas horas diárias de oração, às autoflagelações, às peregr
Biografia de Martinho Lutero



Martinho Lutero era filho de Hans Luther e Margarethe Lindemann. Mudou-se para Mansfeld, onde seu pai dirigia várias minas de cobre. Tendo sido criado no campo, Hans Luther desejava que seu filho viesse a se tornar um funcionário público, melhorando assim as condições da família. Com este objetivo, enviou o jovem Martinho para escolas em Mansfeld, Magdeburgo e Eisenach.

Aos dezessete anos, em 1501, Lutero ingressou na Universidade de Erfurt, onde tocava alaúde e recebeu o apelido de O Filósofo. Seguindo os desejos paternos, inscreveu-se na escola de Direito dessa Universidade. Mas tudo mudou após uma grande tempestade, com descargas elétricas, ocorrida neste mesmo ano (1505): ao voltar de uma visita à casa dos pais, um raio caiu próximo de onde ele estava. Aterrorizado, gritara então: — Ajuda-me, Sant'Ana! Eu me tornarei um monge!

Tendo sobrevivido aos raios, deixou a faculdade, vendeu os seus livros com exceção dos de Virgílio, e entrou para a ordem dos Agostinianos, de Erfurt, a 17 de julho de 1505.

O jovem Martinho Lutero dedicou-se por completo à sua vida no mosteiro, empenhando-se em realizar boas obras a fim de agradar a Deus e servir ao próximo através de orações por suas almas. Dedicou-se intensamente à meditação entregando-se a muitas horas diárias de oração, às autoflagelações, às peregrinações e à confissão. Quanto mais tentava ser agradável ao Senhor, mais se dava conta de seus pecados.

Johann von Staupitz, o superior de Lutero, concluiu que o jovem necessitava de mais trabalhos, para afastá-lo de sua excessiva reflexão. Ordenou, portanto, ao monge que iniciasse uma carreira acadêmica. Em 1507, Lutero foi ordenado sacerdote. Em 1508 começou a lecionar Teologia na Universidade de Wittenberg. Lutero recebeu seu Bacharelado em Estudos Bíblicos em 19 de março de 1508. Dois anos depois visitou Roma, de onde regressou bastante decepcionado.

Em 19 de outubro de 1512, Martinho Lutero graduou-se em Doutor em Teologia e, em 21 de outubro deste ano, foi recebido no Senado da Faculdade Teológica com o título de Doutor em Bíblia. Em 1515, foi nomeado vigário de sua ordem, tendo sob sua responsabilidade onze monastérios. Durante este período estudou grego e hebraico, para se aprofundar no significado e na origem das palavras utilizadas nas Escrituras – conhecimentos que logo utilizaria para a sua tradução da Bíblia.

O desejo de obter os graus acadêmicos levou Lutero a estudar as Escrituras em profundidade. Influenciado por sua formação humanista de buscar ad fontes (nas fontes primárias), mergulhou nos estudos sobre a Igreja Primitiva. Devido a isto, termos como penitência e honestidade ganharam novo significado para ele, já convencido de que a Igreja havia perdido sua visão de várias das verdades do Cristianismo ensinadas nas Escrituras - sendo a mais importante delas a Doutrina da Justificação1 apenas pela fé. Ele começou a ensinar que a Salvação era um benefício concedido apenas por Deus, dado pela Graça divina através de Jesus Cristo e recebido apenas por intermédio da a fé.

Mais tarde, Lutero definiu e reintroduziu o princípio da distinção própria entre a Torá (Leis Mosaicas) e os Evangelhos, que reforçavam sua Teologia da graça. Em conseqüência, Lutero acreditava que seu princípio de interpretação era um ponto inicial essencial para o estudo das Escrituras. Notou, ainda, que a falta de clareza na distinção da Lei e dos Evangelhos era a causa da incorreta compreensão dos Evangelhos de Jesus pela Igreja de seu tempo, instituição a quem responsabilizava por haver criado e fomentado muitos erros teológicos fundamentais.

Além de suas atividades como professor, Martinho Lutero ainda colaborava como pregador e confessor na Igreja de Santa Maria, na Cidade. Também pregava habitualmente na Igreja do Castelo (chamada de Todos os Santos - por causa de ali haver uma coleção de relíquias estabelecidas por Frederico II, de Sabóia). Foi durante este período que o jovem sacerdote deu-se conta dos efeitos em se oferecer [e vender] indulgências aos fiéis como se fossem fregueses.

A indulgência é a remissão (parcial ou total) do castigo temporal que alguém permanece devedor por conta dos seus pecados, de cuja culpa tenha se livrado pela absolvição. Naquele tempo, qualquer pessoa poderia comprar uma indulgência, quer para si mesmo, quer para um parente já morto que estivesse no Purgatório. O frade Johann Tetzel fora recrutado para viajar através dos territórios episcopais do arcebispo Alberto de Mogúncia, promovendo e vendendo indulgências com o objetivo de financiar as Reformas da Basílica de São Pedro, em Roma.

Lutero viu este tráfico de indulgências como um abuso que poderia confundir as pessoas e levá-las a confiar apenas nas indulgências, deixando de lado a confissão e o arrependimento verdadeiro. Proferiu, então, três sermões contra as indulgências em 1516 e 1517. Segundo a tradição, em 31 de outubro de 1517, foram pregadas as 95 Teses na porta da Igreja do Castelo de Wittenberg, com um convite aberto ao debate sobre elas. Estas teses condenavam a avareza e o paganismo na Igreja como um abuso, e pediam um debate teológico sobre o que as indulgências significavam. Para todos os efeitos, Lutero não questionava diretamente a autoridade do Papa para conceder as tais indulgências.

As 95 Teses foram logo traduzidas para o alemão e amplamente copiadas e impressas. Ao cabo de duas semanas haviam se espalhado por toda a Alemanha, e em dois meses por toda a Europa. Este foi o primeiro episódio da História em que a imprensa teve papel primacial, pois facilitava uma distribuição simples e ampla de qualquer documento.

Depois de fazer pouco caso de Lutero, dizendo ser ele um alemão bêbado que escrevera as teses, e afirmando que quando estiver sóbrio mudará de opinião, o Papa Leão X ordenou, em 1518, ao professor de Teologia dominicano Silvestro Mazzolini que investigasse o assunto. Este denunciou que Lutero se opunha de maneira implícita à autoridade do Sumo Pontífice, quando discordava de uma de suas bulas. Declarou ser Lutero um herege, e escreveu uma refutação acadêmica às suas teses. Nela, mantinha a autoridade papal sobre a Igreja e condenava cada desvio como uma apostasia.

Lutero replicou de igual forma, dando assim início à controvérsia. Enquanto isso, Lutero tomava parte da convenção dos agostinianos, em Heidelberg, onde apresentou uma tese sobre a escravidão do homem ao pecado e a graça divina. No decorrer da controvérsia sobre as indulgências, o debate se elevou até ao ponto de duvidar do poder absoluto e autoridade do Papa, pois as doutrinas da Tesouraria da Igreja e da Tesouraria dos Merecimentos, que serviam para reforçar a doutrina e a venda das indulgências, haviam se baseado na bula papal Unigenitus, de 1343, do Papa Clemente VI. Por causa de sua oposição a esta doutrina, Lutero foi qualificado como heresiarca, e o Papa, decidido a suprimir por completo suas opiniões, discordâncias e pregações, ordenou que Lutero fosse chamado a Roma, viagem que deixou de ser realizada por motivos políticos.

Lutero, que anteriormente professava a obediência implícita à Igreja, passou a negar, agora, abertamente a autoridade papal, e apelava para que fosse realizado um Concílio. Também declarava que o papado não formava parte da essência imutável da Igreja original.

Desejando manter relações amistosas com o protetor de Lutero, Frederico, o Sábio, o Papa engendrou uma tentativa final de alcançar uma solução pacífica para o conflito. Uma conferência com o representante papal Karl von Miltitz em Altenburgo, em janeiro de 1519, levou Lutero a decidir guardar silêncio, como também a escrever uma humilde carta ao Papa e compor um tratado demonstrando suas opiniões sobre a Igreja Católica. A carta escrita nunca chegou a ser enviada, pois não continha nenhuma retratação. E no tratado, que compôs mais tarde, Lutero negou qualquer efeito das indulgências no Purgatório.

Quando Johann Eck, em Carlstadt, desafiou um colega de Lutero para um debate em Leipzig, Lutero juntou-se à discussão (27 de junho – 18 de julho de 1519), no curso do qual negou o direito divino do solidéu papal e da autoridade de possuir o poder das chaves, que, segundo ele, haviam sido outorgados à Igreja (como congregação de fé). Negou que a salvação pertencesse à Igreja Católica ocidental sob a autoridade do Papa, mas que esta se mantinha na Igreja Ortodoxa, do Oriente. Depois do debate, Eck afirmou que forçara Lutero a admitir a semelhança de sua própria doutrina com a de João Huss, que havia sido queimado numa fogueira.

Enfim, não parecia haver esperanças de entendimento. Os escritos de Lutero circulavam amplamente, alcançando a França, a Inglaterra e a Itália, em 1519, e os estudantes dirigiam-se a Wittenberg para escutar Lutero, que naquele momento publicava seus comentários sobre a Epístola aos Gálatas e suas Operationes in Psalmos (Trabalho nos Salmos).

As controvérsias geradas por seus escritos levaram Lutero a desenvolver suas doutrinas mais a fundo, e o seu Sermão sobre o Sacramento Abençoado do Verdadeiro e Santo Corpo de Cristo, e suas Irmandades, levou mais além o significado da Eucaristia para o perdão dos pecados, ao fortalecimento da fé naqueles que o recebem, e, ainda, apoiava a realização de um concílio a fim de restituir a comunhão.

O conceito luterano de igreja foi desenvolvido em seu Von dem Papsttum zu Rom (Sobre o Papado de Roma), uma resposta ao ataque do franciscano Augustin von Alveld, em Leipzig (junho de 1520); enquanto o seu Sermon von guten Werken (Sermão das Boas Obras), publicado na primavera de 1520, era contrário à doutrina católica das boas obras e dos atos como meio de perdão, mantendo que as obras do crente são verdadeiramente boas, quer para o secular como para o clérigo, se ordenadas por Deus.

A disputa havida em Leipzig em 1519 fez com que Lutero travasse contato com os humanistas, especialmente Melanchthon, Reuchlin e Erasmo de Roterdã, que, por sua vez, também influenciara ao nobre Franz von Sickingen. Von Sickingen e Silvestre de Schauenbur queriam manter Lutero sob sua proteção, convidando-o para seus castelos na eventualidade de não lhe ser seguro permanecer na Saxônia, em virtude da proscrição papal.

Sob estas circunstâncias de crise e confrontando aos nobres alemães, Lutero escreveu À Nobreza Cristã da Nação Alemã (agosto de 1520), onde recomendava ao laicado, como um sacerdote espiritual, que fizesse a Reforma requerida por Deus, mas abandonada pelo Papa e pelo clero. Pela primeira vez Lutero referiu-se ao Papa como o Anticristo.

As Reformas que Lutero propunha não se referiam apenas a questões doutrinárias, mas também aos abusos eclesiásticos, quais sejam: a diminuição do número de cardeais e de outras exigências da corte papal; a abolição das rendas do Papa; o reconhecimento do governo secular; a renúncia da exigência papal pelo poder temporal; a abolição dos Interditos e abusos relacionados com a excomunhão; a abolição das peregrinações nocivas; a eliminação dos excessivos dias santos; a supressão dos conventos para monjas, da mendicidade e da suntuosidade; a Reforma das universidades; a ab-rogação do celibato do clero; a união dos boêmios; e, finalmente, uma Reforma geral na moralidade pública. Muitas destas propostas refletiam os interesses da nobreza alemã, revoltada com sua submissão ao Papa e, principalmente, com o fato de terem que enviar riquezas a Roma.

Lutero também gerou polêmicas doutrinárias em seu Prelúdio no Cativeiro Babilônico da Igreja, em especial no que diz respeito aos sacramentos. Apoiava que fosse devolvido o Cálice ao laicado; na chamada questão do dogma da transubstanciação, afirmava que era real a presença do Corpo e do Sangue do Cristo na Eucaristia, mas rechaçava o ensinamento de que a Eucaristia era o sacrifício oferecido por Deus. Ensinava que o Batismo trazia a justificação apenas se combinado com a fé salvadora em o receber; de fato, mantinha o princípio da salvação inclusive para aqueles que mais tarde se converteriam. Afirmou que a essência da Penitência consiste na palavra de promessa de desculpas recebidas com fé. Para ele, apenas estes três sacramentos podiam assim ser considerados, pois sua instituição era divina e a promessa da salvação de Deus estava conexa a eles; mas, em sentido estrito, apenas o Batismo e a Eucaristia seriam verdadeiros sacramentos, pois, apenas estes tinham o sinal visível da instituição divina: a água, no Batismo, e o Pão e o Vinho, da eucaristia. Lutero negou, em seu documento, que a confirmação, o matrimônio, a ordenação sacerdotal e a extrema-unção fossem sacramentos.

Da mesma forma, o completo desenvolvimento da doutrina de Lutero sobre a salvação e a vida cristã foi exposta em A Liberdade de um Cristão (publicado em 20 de novembro de 1520), no qual exigia uma completa união com Cristo mediante a palavra através da fé, e a inteira liberdade do cristão como sacerdote e rei sobre todas as coisas exteriores, e um perfeito amor ao próximo. As duas teses que Lutero desenvolveu nesse tratado, aparentemente contraditórias, mas em verdade complementares, são: 1ª - O cristão é um senhor libérrimo sobre tudo, a ninguém sujeito. 2ª - O cristão é um servo oficiosíssimo de tudo, a todos sujeito. A primeira tese é válida na ; a segunda, no amor.

Em 15 de junho de 1520, o Papa advertiu Lutero com a bula Exsurge Domine, na qual o ameaçava com a excomunhão, a menos que em um prazo de sessenta dias repudiasse 41 pontos de sua doutrina, selecionados em seus escritos. Em outubro de 1520 Lutero enviou seu escrito A Liberdade de um Cristão ao Papa, acrescentando a frase significativa: Eu não me submeto a leis ao interpretar a Palavra de Deus.

Enquanto isso, um rumor chegara de que Johan Ech saíra de Meissem com uma proibição papal, enquanto este se pronunciara realmente a 21 de setembro. O último esforço de paz de Lutero foi seguido, em 12 de dezembro, da queima da bula, que já tinha expirado há 120 dias, e o decreto papal de Wittenberg, defendendo-se com seus Warum des Papstes und seiner Jünger Bücher Verbrannt Sind e Assertio Omnium Orticulorum. O Papa Leão X excomungou Lutero em 3 de janeiro de 1521, na bula Decet Romanum Pontificem. A execução da proibição, com efeito, foi evitada pela relação do Papa com Frederico III da Saxônia, e pelo novo imperador Carlo I da Espanha (Carlos V) que julgou inoportuna apoiar as medidas contra Lutero, diante de sua posição face a Dieta.2

O Imperador Carlos V inaugurou a Dieta real em 22 de janeiro de 1521. Lutero foi chamado a renunciar ou confirmar seus ditos e lhe foi outorgado um salvo-conduto para garantir seu seguro deslocamento. Em 16 de abril, Lutero apresentou-se diante da Dieta. Johann Eck, assistente do Arcebispo de Trier, mostrou a Lutero uma mesa cheia de cópias de seus escritos. Perguntou, então, a Lutero se os livros eram seus e se ele acreditava naquilo que as obras diziam. Lutero pediu um tempo para pensar na sua resposta, o que lhe foi concedido. Este, então, isolou-se em oração, e depois consultou seus aliados e amigos, apresentando-se à Dieta no dia seguinte. Quando a Dieta veio a tratar do assunto, o conselheiro Eck pediu a Lutero que respondesse explicitamente: — Lutero, repeles seus livros e os erros que eles contêm? Lutero, então, respondeu: — Que se me convençam mediante testemunho das Escrituras e claros argumentos da razão, porque não acredito nem no Papa nem nos concílios, já que está provado amiúde que estão errados, contradizendo-se a si mesmos pelos textos da Sagrada Escritura que citei. Estou submetido à minha consciência e unido à palavra de Deus. Por isto, não posso nem quero me retratar de nada, porque fazer algo contra a consciência não é seguro nem saudável. De acordo com a tradição, Lutero, então, proferiu estas palavras: — Não posso fazer outra coisa, esta é a minha posição. Que Deus me ajude!

Nos dias seguintes, seguiram-se muitas conferências privadas para determinar qual o destino de Lutero. Antes que a decisão fosse tomada, Lutero abandonou Worms. Durante seu regresso a Wittenberg, desapareceu. O Imperador redigiu o Édito de Worms, em 25 de maio de 1521, declarando Martinho Lutero fugitivo e herege, e proibindo suas obras.

Em junho de 1518, foi aberto o processo contra Lutero, com base na publicação das suas 95 Teses. Alegava-se que estas incorriam em heresia, a serem, portanto, examinadas pelo processo. Nas aulas que dava na Universidade de Wittenberg, espiões registravam os comentários negativos de Lutero sobre a excomunhão. Depois disso, em agosto de 1518, o processo é alterado para heresia notória. Lutero é convidado para ir a Roma, onde deveria desmentir sua doutrina. Lutero recusou-se a fazê-lo, alegando razões de saúde e propôs uma audiência em território alemão. O seu pedido baseou-se no argumento (Gravamina) da Nação Alemã. O seu pedido foi aceito, e ele foi convidado para uma audiência com o cardeal Caetano de Vio (Tomás Caetano), durante a reunião das cortes imperiais de Augsburg. Entre 12 e 14 de outubro de 1518, Lutero falou a Caetano. Este pediu-lhe que revogasse sua doutrina. Lutero recusou-se a fazê-lo.

Do lado romano, o caso pareceu terminado. Por causa da morte de Imperador Maximiliano I (janeiro de 1519), houve uma pausa de dois anos. O Imperador havia decidido que o seu sucessor seria Carlos (futuro Carlos V). Por causa das pertenças de Carlos, na Itália, o papa renascentista Leão X receava o cerco do Estado da Igreja e procurou evitar que os príncipes-eleitores alemães (Kurfürsten) renunciassem a Carlos.

O papel de protetor de Lutero assumido por Frederico, o Sábio, levou Roma a pedir a Karl von Miltiz que intercedesse junto ao príncipe por uma solução razoável. Após a escolha de Carlos V como imperador (26 de junho de 1519), o processo de Lutero voltaria a ser reatado.

O seqüestro de Lutero durante a sua viagem de regresso foi arranjado. Frederico, o Sábio ordenou que Lutero fosse capturado no seu retorno da Dieta de Worms por um grupo de homens mascarados a cavalo, que o levaram para o Castelo de Wartburg, em Eisenach, onde ele permaneceu por cerca de um ano. Deixou crescer a barba e tomou as vestes de um cavaleiro, assumindo o pseudônimo de Jörg. Durante este período de retiro forçado, Lutero trabalhou na sua célebre tradução da Bíblia para o alemão.

Com o início da estada de Lutero em Wartburg começou um período construtivo de sua carreira como reformista. Em seu deserto ou patmos (como ele mesmo chamava, em suas cartas) de Wartburg, começou a tradução da Bíblia, da qual foi impresso o Novo Testamento em setembro de 1522.
Produziu outros escritos, preparou a primeira parte de seu guia para párocos e Von der Beichte (Sobre a Confissão), em que negava a obrigatoriedade da confissão, e admitia como saudável a confissão privada e voluntária. Também escreveu contra o Arcebispo Albrecht, a quem obrigou, com isto, a desistir de retomar a venda das indulgências; quanto a seus ataques a Jacobus Latomus, avançou em sua visão sobre a relação entre a graça e a lei, assim como sobre a natureza revelada pelo Cristo, distinguindo o objetivo da graça de Deus para o pecador, que, por acreditar, é justificado por Deus devido à justiça de Cristo, pois a graça salvadora reside dentro do homem pecador; e ainda que o princípio da justificação é insuficiente, ante a persistência do pecado depois do Batismo – pela inerência do pecado em cada boa obra.

Lutero amiúde escrevia cartas a seus amigos e aliados, respondendo ou perguntando seus pontos de vista e respondendo aos pedidos de conselhos. Por exemplo, Felipe Melanchthon lhe escreveu perguntando como responder à acusação de que os reformistas renegavam a peregrinação, e outras formas tradicionais de piedade. Lutero lhe respondeu em 1º de agosto de 1521:

Se és um pregador da misericórdia, não pregues uma misericórdia imaginária, mas, sim, uma misericórdia verdadeira. Se a misericórdia é verdadeira, deve penitenciar ao pecado verdadeiro, não imaginário. Deus não salva apenas aqueles que são pecadores imaginários. Conheça o pecador e veja se os seus pecados são fortes, mas deixai que tua confiança em Cristo seja ainda mais forte e que se alegre em Cristo, que é o vencedor sobre o pecado, a morte e o mundo. Cometeremos pecados enquanto estivermos aqui, porque nesta vida não há um só lugar onde resida a justiça. Nós todos, sem embargo, disse Pedro (2ª Pedro III, 13), estamos buscando mais além um novo céu e uma nova Terra onde a justiça reinará.


Enquanto isto, alguns sacerdotes saxões haviam renunciado ao voto de castidade, ao tempo em que outros tantos atacavam os votos monásticos. Lutero, em seu De Votis Monasticis (Sobre os Votos Monásticos), aconselhava a ter mais cautela, aceitando, no fundo, que os votos eram geralmente tomados com a intenção da salvação ou busca de justificação. Com a aprovação de Lutero em seu De Abroganda Missa Privata (Sobre a Ab-rogação da Missa Privada), mas contra a firme oposição de seu prior, os agostinianos de Wittenberg realizaram a troca das formas de adoração e terminaram com as missas. Sua violência e intolerância, certamente, desagradaram a Lutero, que em princípios de dezembro passou uns dias entre eles. Ao retornar para Wartburg, escreveu Eine Treue Vermahnung vor Aufruhr und Empörung (Uma Sincera Admoestação por Martinho Lutero a Todos os Cristãos para que se Resguardem da Insurreição e da Rebelião). Apesar disto, em Wittengerg, Carlstadt e o ex-agostiniano Gabriel Zwilling reclamavam pela abolição da missa privada e da comunhão em duas espécies, assim como a eliminação das imagens nas igrejas e na ab-rogação do celibato.


Ao fim de 1521, os anabatistas3 de Zwickau se entregam à anarquia. Contrário a tais concepções radicais e temendo seus resultados, Lutero regressa em segredo a Wittenberg em 6 de março de 1522. Durante oito dias, a partir de 9 de março (domigo de Invocavit) e concluindo no domingo seguinte, Lutero pregou outros tantos sermões que tornaram-se conhecidos como os Sermões de 'Invocavit'. Nestas pregações, Lutero aconselha uma Reforma cuidadosa, que leve em consideração a consciência daqueles que ainda não estão persuadidos a acolher a Reforma. A consagração do Pão foi restaurada por um tempo e o Cálice sagrado foi ministrado somente àqueles do laicado que o desejaram. O cânon das missas, devido ao seu caráter imolatório, foi suprimido. Devido ao Sacramento da Confissão haver sido abolido, confrontou-se com a necessidade que muitas pessoas ainda tinham de se confessar e de buscar assim o perdão. Esta nova forma de serviço foi dada a Lutero em Formula Missæ et Communionis (Fórmula da Missa e Comunhão), de 1523. Em 1524, apareceu o primeiro hinário de Wittenberg, com quatro hinos.

Como esta parte da Saxônia era governada pelo Duque Jorge, que proibira seus escritos, Lutero declarou que a autoridade civil não podia promulgar leis para a alma, em seu Über Ddie Weltliche Gewalt, Wie Weit Man Ihr Gehorsam Schuldig Sei (Autoridade Temporal: em que Medida Deve Ser Obedecida).

A guerra dos camponeses (1524 - 1525) foi, de muitas maneiras, uma resposta aos discursos de Lutero e de outros Reformadores. Revoltas de camponeses já haviam acontecido em pequena escala em Flandres (1321-1323), na França (1358) e na Inglaterra (1381-1388), durante as guerras hussitas do século XV, e muitas outras até o século XVIII, mas muitos camponeses julgaram que os ataques verbais de Lutero à Igreja e á sua hierarquia significavam que os Reformadores iriam igualmente apoiar um ataque armado à hierarquia social. Por causa dos fortes laços entre a nobreza hereditária e os líderes da Igreja que Lutero condenava, isto não seria surpreendente.

Já em 1522, enquanto Lutero estava em Wartburg, colaboradores seus perverteram seus ensinamentos e passaram a pregar mensagens revolucionárias por toda a Alemanha. Enfatizava-se a formação de um grupo de santos (espalharam boatos de que estes santos, seriam a causa da derrota da Igreja Católica), com a tarefa de lutar contra a autoridade constituída e promover a aniquilação dos ímpios (Igreja Católica). Um desses pregadores foi Tomas Müntzer. A mensagem escatológica de Müntzer, na verdade, tinha pouco a ver com a proposta dos camponeses, tanto que ele procurou a nobreza da Saxônia para obter apoio. Com a negativa destes e a eclosão dos conflitos camponeses no sudoeste alemão, ele logo viu o instrumento para a concretização de seus planos.

Lutero, desde cedo, prevenira a nobreza e os próprios camponeses sobre a revolta, e particularmente sobre Müntzer, um dos profetas do assassínio, colocando-o como um dos mentores do movimento camponês. Lutero escreveu a Terrível História e Juízo de Deus sobre Tomas Müntzer, inaugurando essa linha de pensamento.

Na iminência da revolta (1524), Lutero escreveu a Carta aos Príncipes da Saxônia sobre o Espírito Revoltoso, mostrando a tirania dos nobres que oprimiam o povo e a loucura dos camponeses em reagir através da força e a confiar em Müntzer como pregador. Houve pouca repercussão deste escrito.

Ainda em 1524, Müntzer mudou-se para a cidade imperial de Mühlhausen, oferecendo-se como pregador. Lutero escreveu a Carta Aberta aos Burgomestres, Conselho e toda a Comunidade da Cidade de Mühlhausen com o propósito de alertar sobre as intenções de Müntzer. Também este escrito não teve repercussão, pois o conselho da Cidade limitou-se a pedir informações sobre Müntzer na cidade imperial de Weimar.
inações e à confissão. Quanto mais tentava ser agradável ao Senhor, mais se dava conta de seus pecados.

Johann von Staupitz, o superior de Lutero, concluiu que o jovem necessitava de mais trabalhos, para afastá-lo de sua excessiva reflexão. Ordenou, portanto, ao monge que iniciasse uma carreira acadêmica. Em 1507, Lutero foi ordenado sacerdote. Em 1508 começou a lecionar Teologia na Universidade de Wittenberg. Lutero recebeu seu Bacharelado em Estudos Bíblicos em 19 de março de 1508. Dois anos depois visitou Roma, de onde regressou bastante decepcionado.

Em 19 de outubro de 1512, Martinho Lutero graduou-se em Doutor em Teologia e, em 21 de outubro deste ano, foi recebido no Senado da Faculdade Teológica com o título de Doutor em Bíblia. Em 1515, foi nomeado vigário de sua ordem, tendo sob sua responsabilidade onze monastérios. Durante este período estudou grego e hebraico, para se aprofundar no significado e na origem das palavras utilizadas nas Escrituras – conhecimentos que logo utilizaria para a sua tradução da Bíblia.

O desejo de obter os graus acadêmicos levou Lutero a estudar as Escrituras em profundidade. Influenciado por sua formação humanista de buscar ad fontes (nas fontes primárias), mergulhou nos estudos sobre a Igreja Primitiva. Devido a isto, termos como penitência e honestidade ganharam novo significado para ele, já convencido de que a Igreja havia perdido sua visão de várias das verdades do Cristianismo ensinadas nas Escrituras - sendo a mais importante delas a Doutrina da Justificação1 apenas pela fé. Ele começou a ensinar que a Salvação era um benefício concedido apenas por Deus, dado pela Graça divina através de Jesus Cristo e recebido apenas por intermédio da a fé.

Mais tarde, Lutero definiu e reintroduziu o princípio da distinção própria entre a Torá (Leis Mosaicas) e os Evangelhos, que reforçavam sua Teologia da graça. Em conseqüência, Lutero acreditava que seu princípio de interpretação era um ponto inicial essencial para o estudo das Escrituras. Notou, ainda, que a falta de clareza na distinção da Lei e dos Evangelhos era a causa da incorreta compreensão dos Evangelhos de Jesus pela Igreja de seu tempo, instituição a quem responsabilizava por haver criado e fomentado muitos erros teológicos fundamentais.

Além de suas atividades como professor, Martinho Lutero ainda colaborava como pregador e confessor na Igreja de Santa Maria, na Cidade. Também pregava habitualmente na Igreja do Castelo (chamada de Todos os Santos - por causa de ali haver uma coleção de relíquias estabelecidas por Frederico II, de Sabóia). Foi durante este período que o jovem sacerdote deu-se conta dos efeitos em se oferecer [e vender] indulgências aos fiéis como se fossem fregueses.

A indulgência é a remissão (parcial ou total) do castigo temporal que alguém permanece devedor por conta dos seus pecados, de cuja culpa tenha se livrado pela absolvição. Naquele tempo, qualquer pessoa poderia comprar uma indulgência, quer para si mesmo, quer para um parente já morto que estivesse no Purgatório. O frade Johann Tetzel fora recrutado para viajar através dos territórios episcopais do arcebispo Alberto de Mogúncia, promovendo e vendendo indulgências com o objetivo de financiar as Reformas da Basílica de São Pedro, em Roma.

Lutero viu este tráfico de indulgências como um abuso que poderia confundir as pessoas e levá-las a confiar apenas nas indulgências, deixando de lado a confissão e o arrependimento verdadeiro. Proferiu, então, três sermões contra as indulgências em 1516 e 1517. Segundo a tradição, em 31 de outubro de 1517, foram pregadas as 95 Teses na porta da Igreja do Castelo de Wittenberg, com um convite aberto ao debate sobre elas. Estas teses condenavam a avareza e o paganismo na Igreja como um abuso, e pediam um debate teológico sobre o que as indulgências significavam. Para todos os efeitos, Lutero não questionava diretamente a autoridade do Papa para conceder as tais indulgências.

As 95 Teses foram logo traduzidas para o alemão e amplamente copiadas e impressas. Ao cabo de duas semanas haviam se espalhado por toda a Alemanha, e em dois meses por toda a Europa. Este foi o primeiro episódio da História em que a imprensa teve papel primacial, pois facilitava uma distribuição simples e ampla de qualquer documento.

Depois de fazer pouco caso de Lutero, dizendo ser ele um alemão bêbado que escrevera as teses, e afirmando que quando estiver sóbrio mudará de opinião, o Papa Leão X ordenou, em 1518, ao professor de Teologia dominicano Silvestro Mazzolini que investigasse o assunto. Este denunciou que Lutero se opunha de maneira implícita à autoridade do Sumo Pontífice, quando discordava de uma de suas bulas. Declarou ser Lutero um herege, e escreveu uma refutação acadêmica às suas teses. Nela, mantinha a autoridade papal sobre a Igreja e condenava cada desvio como uma apostasia.

Lutero replicou de igual forma, dando assim início à controvérsia. Enquanto isso, Lutero tomava parte da convenção dos agostinianos, em Heidelberg, onde apresentou uma tese sobre a escravidão do homem ao pecado e a graça divina. No decorrer da controvérsia sobre as indulgências, o debate se elevou até ao ponto de duvidar do poder absoluto e autoridade do Papa, pois as doutrinas da Tesouraria da Igreja e da Tesouraria dos Merecimentos, que serviam para reforçar a doutrina e a venda das indulgências, haviam se baseado na bula papal Unigenitus, de 1343, do Papa Clemente VI. Por causa de sua oposição a esta doutrina, Lutero foi qualificado como heresiarca, e o Papa, decidido a suprimir por completo suas opiniões, discordâncias e pregações, ordenou que Lutero fosse chamado a Roma, viagem que deixou de ser realizada por motivos políticos.

Lutero, que anteriormente professava a obediência implícita à Igreja, passou a negar, agora, abertamente a autoridade papal, e apelava para que fosse realizado um Concílio. Também declarava que o papado não formava parte da essência imutável da Igreja original.

Desejando manter relações amistosas com o protetor de Lutero, Frederico, o Sábio, o Papa engendrou uma tentativa final de alcançar uma solução pacífica para o conflito. Uma conferência com o representante papal Karl von Miltitz em Altenburgo, em janeiro de 1519, levou Lutero a decidir guardar silêncio, como também a escrever uma humilde carta ao Papa e compor um tratado demonstrando suas opiniões sobre a Igreja Católica. A carta escrita nunca chegou a ser enviada, pois não continha nenhuma retratação. E no tratado, que compôs mais tarde, Lutero negou qualquer efeito das indulgências no Purgatório.

Quando Johann Eck, em Carlstadt, desafiou um colega de Lutero para um debate em Leipzig, Lutero juntou-se à discussão (27 de junho – 18 de julho de 1519), no curso do qual negou o direito divino do solidéu papal e da autoridade de possuir o poder das chaves, que, segundo ele, haviam sido outorgados à Igreja (como congregação de fé). Negou que a salvação pertencesse à Igreja Católica ocidental sob a autoridade do Papa, mas que esta se mantinha na Igreja Ortodoxa, do Oriente. Depois do debate, Eck afirmou que forçara Lutero a admitir a semelhança de sua própria doutrina com a de João Huss, que havia sido queimado numa fogueira.

Enfim, não parecia haver esperanças de entendimento. Os escritos de Lutero circulavam amplamente, alcançando a França, a Inglaterra e a Itália, em 1519, e os estudantes dirigiam-se a Wittenberg para escutar Lutero, que naquele momento publicava seus comentários sobre a Epístola aos Gálatas e suas Operationes in Psalmos (Trabalho nos Salmos).

As controvérsias geradas por seus escritos levaram Lutero a desenvolver suas doutrinas mais a fundo, e o seu Sermão sobre o Sacramento Abençoado do Verdadeiro e Santo Corpo de Cristo, e suas Irmandades, levou mais além o significado da Eucaristia para o perdão dos pecados, ao fortalecimento da fé naqueles que o recebem, e, ainda, apoiava a realização de um concílio a fim de restituir a comunhão.

O conceito luterano de igreja foi desenvolvido em seu Von dem Papsttum zu Rom (Sobre o Papado de Roma), uma resposta ao ataque do franciscano Augustin von Alveld, em Leipzig (junho de 1520); enquanto o seu Sermon von guten Werken (Sermão das Boas Obras), publicado na primavera de 1520, era contrário à doutrina católica das boas obras e dos atos como meio de perdão, mantendo que as obras do crente são verdadeiramente boas, quer para o secular como para o clérigo, se ordenadas por Deus.

A disputa havida em Leipzig em 1519 fez com que Lutero travasse contato com os humanistas, especialmente Melanchthon, Reuchlin e Erasmo de Roterdã, que, por sua vez, também influenciara ao nobre Franz von Sickingen. Von Sickingen e Silvestre de Schauenbur queriam manter Lutero sob sua proteção, convidando-o para seus castelos na eventualidade de não lhe ser seguro permanecer na Saxônia, em virtude da proscrição papal.

Sob estas circunstâncias de crise e confrontando aos nobres alemães, Lutero escreveu À Nobreza Cristã da Nação Alemã (agosto de 1520), onde recomendava ao laicado, como um sacerdote espiritual, que fizesse a Reforma requerida por Deus, mas abandonada pelo Papa e pelo clero. Pela primeira vez Lutero referiu-se ao Papa como o Anticristo.

As Reformas que Lutero propunha não se referiam apenas a questões doutrinárias, mas também aos abusos eclesiásticos, quais sejam: a diminuição do número de cardeais e de outras exigências da corte papal; a abolição das rendas do Papa; o reconhecimento do governo secular; a renúncia da exigência papal pelo poder temporal; a abolição dos Interditos e abusos relacionados com a excomunhão; a abolição das peregrinações nocivas; a eliminação dos excessivos dias santos; a supressão dos conventos para monjas, da mendicidade e da suntuosidade; a Reforma das universidades; a ab-rogação do celibato do clero; a união dos boêmios; e, finalmente, uma Reforma geral na moralidade pública. Muitas destas propostas refletiam os interesses da nobreza alemã, revoltada com sua submissão ao Papa e, principalmente, com o fato de terem que enviar riquezas a Roma.

Lutero também gerou polêmicas doutrinárias em seu Prelúdio no Cativeiro Babilônico da Igreja, em especial no que diz respeito aos sacramentos. Apoiava que fosse devolvido o Cálice ao laicado; na chamada questão do dogma da transubstanciação, afirmava que era real a presença do Corpo e do Sangue do Cristo na Eucaristia, mas rechaçava o ensinamento de que a Eucaristia era o sacrifício oferecido por Deus. Ensinava que o Batismo trazia a justificação apenas se combinado com a fé salvadora em o receber; de fato, mantinha o princípio da salvação inclusive para aqueles que mais tarde se converteriam. Afirmou que a essência da Penitência consiste na palavra de promessa de desculpas recebidas com fé. Para ele, apenas estes três sacramentos podiam assim ser considerados, pois sua instituição era divina e a promessa da salvação de Deus estava conexa a eles; mas, em sentido estrito, apenas o Batismo e a Eucaristia seriam verdadeiros sacramentos, pois, apenas estes tinham o sinal visível da instituição divina: a água, no Batismo, e o Pão e o Vinho, da eucaristia. Lutero negou, em seu documento, que a confirmação, o matrimônio, a ordenação sacerdotal e a extrema-unção fossem sacramentos.

Da mesma forma, o completo desenvolvimento da doutrina de Lutero sobre a salvação e a vida cristã foi exposta em A Liberdade de um Cristão (publicado em 20 de novembro de 1520), no qual exigia uma completa união com Cristo mediante a palavra através da fé, e a inteira liberdade do cristão como sacerdote e rei sobre todas as coisas exteriores, e um perfeito amor ao próximo. As duas teses que Lutero desenvolveu nesse tratado, aparentemente contraditórias, mas em verdade complementares, são: 1ª - O cristão é um senhor libérrimo sobre tudo, a ninguém sujeito. 2ª - O cristão é um servo oficiosíssimo de tudo, a todos sujeito. A primeira tese é válida na ; a segunda, no amor.

Em 15 de junho de 1520, o Papa advertiu Lutero com a bula Exsurge Domine, na qual o ameaçava com a excomunhão, a menos que em um prazo de sessenta dias repudiasse 41 pontos de sua doutrina, selecionados em seus escritos. Em outubro de 1520 Lutero enviou seu escrito A Liberdade de um Cristão ao Papa, acrescentando a frase significativa: Eu não me submeto a leis ao interpretar a Palavra de Deus.

Enquanto isso, um rumor chegara de que Johan Ech saíra de Meissem com uma proibição papal, enquanto este se pronunciara realmente a 21 de setembro. O último esforço de paz de Lutero foi seguido, em 12 de dezembro, da queima da bula, que já tinha expirado há 120 dias, e o decreto papal de Wittenberg, defendendo-se com seus Warum des Papstes und seiner Jünger Bücher Verbrannt Sind e Assertio Omnium Orticulorum. O Papa Leão X excomungou Lutero em 3 de janeiro de 1521, na bula Decet Romanum Pontificem. A execução da proibição, com efeito, foi evitada pela relação do Papa com Frederico III da Saxônia, e pelo novo imperador Carlo I da Espanha (Carlos V) que julgou inoportuna apoiar as medidas contra Lutero, diante de sua posição face a Dieta.2

O Imperador Carlos V inaugurou a Dieta real em 22 de janeiro de 1521. Lutero foi chamado a renunciar ou confirmar seus ditos e lhe foi outorgado um salvo-conduto para garantir seu seguro deslocamento. Em 16 de abril, Lutero apresentou-se diante da Dieta. Johann Eck, assistente do Arcebispo de Trier, mostrou a Lutero uma mesa cheia de cópias de seus escritos. Perguntou, então, a Lutero se os livros eram seus e se ele acreditava naquilo que as obras diziam. Lutero pediu um tempo para pensar na sua resposta, o que lhe foi concedido. Este, então, isolou-se em oração, e depois consultou seus aliados e amigos, apresentando-se à Dieta no dia seguinte. Quando a Dieta veio a tratar do assunto, o conselheiro Eck pediu a Lutero que respondesse explicitamente: — Lutero, repeles seus livros e os erros que eles contêm? Lutero, então, respondeu: — Que se me convençam mediante testemunho das Escrituras e claros argumentos da razão, porque não acredito nem no Papa nem nos concílios, já que está provado amiúde que estão errados, contradizendo-se a si mesmos pelos textos da Sagrada Escritura que citei. Estou submetido à minha consciência e unido à palavra de Deus. Por isto, não posso nem quero me retratar de nada, porque fazer algo contra a consciência não é seguro nem saudável. De acordo com a tradição, Lutero, então, proferiu estas palavras: — Não posso fazer outra coisa, esta é a minha posição. Que Deus me ajude!

Nos dias seguintes, seguiram-se muitas conferências privadas para determinar qual o destino de Lutero. Antes que a decisão fosse tomada, Lutero abandonou Worms. Durante seu regresso a Wittenberg, desapareceu. O Imperador redigiu o Édito de Worms, em 25 de maio de 1521, declarando Martinho Lutero fugitivo e herege, e proibindo suas obras.

Em junho de 1518, foi aberto o processo contra Lutero, com base na publicação das suas 95 Teses. Alegava-se que estas incorriam em heresia, a serem, portanto, examinadas pelo processo. Nas aulas que dava na Universidade de Wittenberg, espiões registravam os comentários negativos de Lutero sobre a excomunhão. Depois disso, em agosto de 1518, o processo é alterado para heresia notória. Lutero é convidado para ir a Roma, onde deveria desmentir sua doutrina. Lutero recusou-se a fazê-lo, alegando razões de saúde e propôs uma audiência em território alemão. O seu pedido baseou-se no argumento (Gravamina) da Nação Alemã. O seu pedido foi aceito, e ele foi convidado para uma audiência com o cardeal Caetano de Vio (Tomás Caetano), durante a reunião das cortes imperiais de Augsburg. Entre 12 e 14 de outubro de 1518, Lutero falou a Caetano. Este pediu-lhe que revogasse sua doutrina. Lutero recusou-se a fazê-lo.

Do lado romano, o caso pareceu terminado. Por causa da morte de Imperador Maximiliano I (janeiro de 1519), houve uma pausa de dois anos. O Imperador havia decidido que o seu sucessor seria Carlos (futuro Carlos V). Por causa das pertenças de Carlos, na Itália, o papa renascentista Leão X receava o cerco do Estado da Igreja e procurou evitar que os príncipes-eleitores alemães (Kurfürsten) renunciassem a Carlos.

O papel de protetor de Lutero assumido por Frederico, o Sábio, levou Roma a pedir a Karl von Miltiz que intercedesse junto ao príncipe por uma solução razoável. Após a escolha de Carlos V como imperador (26 de junho de 1519), o processo de Lutero voltaria a ser reatado.

O seqüestro de Lutero durante a sua viagem de regresso foi arranjado. Frederico, o Sábio ordenou que Lutero fosse capturado no seu retorno da Dieta de Worms por um grupo de homens mascarados a cavalo, que o levaram para o Castelo de Wartburg, em Eisenach, onde ele permaneceu por cerca de um ano. Deixou crescer a barba e tomou as vestes de um cavaleiro, assumindo o pseudônimo de Jörg. Durante este período de retiro forçado, Lutero trabalhou na sua célebre tradução da Bíblia para o alemão.

Com o início da estada de Lutero em Wartburg começou um período construtivo de sua carreira como reformista. Em seu deserto ou patmos (como ele mesmo chamava, em suas cartas) de Wartburg, começou a tradução da Bíblia, da qual foi impresso o Novo Testamento em setembro de 1522.
Produziu outros escritos, preparou a primeira parte de seu guia para párocos e Von der Beichte (Sobre a Confissão), em que negava a obrigatoriedade da confissão, e admitia como saudável a confissão privada e voluntária. Também escreveu contra o Arcebispo Albrecht, a quem obrigou, com isto, a desistir de retomar a venda das indulgências; quanto a seus ataques a Jacobus Latomus, avançou em sua visão sobre a relação entre a graça e a lei, assim como sobre a natureza revelada pelo Cristo, distinguindo o objetivo da graça de Deus para o pecador, que, por acreditar, é justificado por Deus devido à justiça de Cristo, pois a graça salvadora reside dentro do homem pecador; e ainda que o princípio da justificação é insuficiente, ante a persistência do pecado depois do Batismo – pela inerência do pecado em cada boa obra.

Lutero amiúde escrevia cartas a seus amigos e aliados, respondendo ou perguntando seus pontos de vista e respondendo aos pedidos de conselhos. Por exemplo, Felipe Melanchthon lhe escreveu perguntando como responder à acusação de que os reformistas renegavam a peregrinação, e outras formas tradicionais de piedade. Lutero lhe respondeu em 1º de agosto de 1521:

Se és um pregador da misericórdia, não pregues uma misericórdia imaginária, mas, sim, uma misericórdia verdadeira. Se a misericórdia é verdadeira, deve penitenciar ao pecado verdadeiro, não imaginário. Deus não salva apenas aqueles que são pecadores imaginários. Conheça o pecador e veja se os seus pecados são fortes, mas deixai que tua confiança em Cristo seja ainda mais forte e que se alegre em Cristo, que é o vencedor sobre o pecado, a morte e o mundo. Cometeremos pecados enquanto estivermos aqui, porque nesta vida não há um só lugar onde resida a justiça. Nós todos, sem embargo, disse Pedro (2ª Pedro III, 13), estamos buscando mais além um novo céu e uma nova Terra onde a justiça reinará.


Enquanto isto, alguns sacerdotes saxões haviam renunciado ao voto de castidade, ao tempo em que outros tantos atacavam os votos monásticos. Lutero, em seu De Votis Monasticis (Sobre os Votos Monásticos), aconselhava a ter mais cautela, aceitando, no fundo, que os votos eram geralmente tomados com a intenção da salvação ou busca de justificação. Com a aprovação de Lutero em seu De Abroganda Missa Privata (Sobre a Ab-rogação da Missa Privada), mas contra a firme oposição de seu prior, os agostinianos de Wittenberg realizaram a troca das formas de adoração e terminaram com as missas. Sua violência e intolerância, certamente, desagradaram a Lutero, que em princípios de dezembro passou uns dias entre eles. Ao retornar para Wartburg, escreveu Eine Treue Vermahnung vor Aufruhr und Empörung (Uma Sincera Admoestação por Martinho Lutero a Todos os Cristãos para que se Resguardem da Insurreição e da Rebelião). Apesar disto, em Wittengerg, Carlstadt e o ex-agostiniano Gabriel Zwilling reclamavam pela abolição da missa privada e da comunhão em duas espécies, assim como a eliminação das imagens nas igrejas e na ab-rogação do celibato.


Ao fim de 1521, os anabatistas3 de Zwickau se entregam à anarquia. Contrário a tais concepções radicais e temendo seus resultados, Lutero regressa em segredo a Wittenberg em 6 de março de 1522. Durante oito dias, a partir de 9 de março (domigo de Invocavit) e concluindo no domingo seguinte, Lutero pregou outros tantos sermões que tornaram-se conhecidos como os Sermões de 'Invocavit'. Nestas pregações, Lutero aconselha uma Reforma cuidadosa, que leve em consideração a consciência daqueles que ainda não estão persuadidos a acolher a Reforma. A consagração do Pão foi restaurada por um tempo e o Cálice sagrado foi ministrado somente àqueles do laicado que o desejaram. O cânon das missas, devido ao seu caráter imolatório, foi suprimido. Devido ao Sacramento da Confissão haver sido abolido, confrontou-se com a necessidade que muitas pessoas ainda tinham de se confessar e de buscar assim o perdão. Esta nova forma de serviço foi dada a Lutero em Formula Missæ et Communionis (Fórmula da Missa e Comunhão), de 1523. Em 1524, apareceu o primeiro hinário de Wittenberg, com quatro hinos.

Como esta parte da Saxônia era governada pelo Duque Jorge, que proibira seus escritos, Lutero declarou que a autoridade civil não podia promulgar leis para a alma, em seu Über Ddie Weltliche Gewalt, Wie Weit Man Ihr Gehorsam Schuldig Sei (Autoridade Temporal: em que Medida Deve Ser Obedecida).

A guerra dos camponeses (1524 - 1525) foi, de muitas maneiras, uma resposta aos discursos de Lutero e de outros Reformadores. Revoltas de camponeses já haviam acontecido em pequena escala em Flandres (1321-1323), na França (1358) e na Inglaterra (1381-1388), durante as guerras hussitas do século XV, e muitas outras até o século XVIII, mas muitos camponeses julgaram que os ataques verbais de Lutero à Igreja e á sua hierarquia significavam que os Reformadores iriam igualmente apoiar um ataque armado à hierarquia social. Por causa dos fortes laços entre a nobreza hereditária e os líderes da Igreja que Lutero condenava, isto não seria surpreendente.

Já em 1522, enquanto Lutero estava em Wartburg, colaboradores seus perverteram seus ensinamentos e passaram a pregar mensagens revolucionárias por toda a Alemanha. Enfatizava-se a formação de um grupo de santos (espalharam boatos de que estes santos, seriam a causa da derrota da Igreja Católica), com a tarefa de lutar contra a autoridade constituída e promover a aniquilação dos ímpios (Igreja Católica). Um desses pregadores foi Tomas Müntzer. A mensagem escatológica de Müntzer, na verdade, tinha pouco a ver com a proposta dos camponeses, tanto que ele procurou a nobreza da Saxônia para obter apoio. Com a negativa destes e a eclosão dos conflitos camponeses no sudoeste alemão, ele logo viu o instrumento para a concretização de seus planos.

Lutero, desde cedo, prevenira a nobreza e os próprios camponeses sobre a revolta, e particularmente sobre Müntzer, um dos profetas do assassínio, colocando-o como um dos mentores do movimento camponês. Lutero escreveu a Terrível História e Juízo de Deus sobre Tomas Müntzer, inaugurando essa linha de pensamento.

Na iminência da revolta (1524), Lutero escreveu a Carta aos Príncipes da Saxônia sobre o Espírito Revoltoso, mostrando a tirania dos nobres que oprimiam o povo e a loucura dos camponeses em reagir através da força e a confiar em Müntzer como pregador. Houve pouca repercussão deste escrito.

Ainda em 1524, Müntzer mudou-se para a cidade imperial de Mühlhausen, oferecendo-se como pregador. Lutero escreveu a Carta Aberta aos Burgomestres, Conselho e toda a Comunidade da Cidade de Mühlhausen com o propósito de alertar sobre as intenções de Müntzer. Também este escrito não teve repercussão, pois o conselho da Cidade limitou-se a pedir informações sobre Müntzer na cidade imperial de Weimar.

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